segunda-feira, 22 de março de 2010

Eunice Muñoz

“…amo-te mais do que apenas mais um dia…”.

Lembro-me de, em criança, escutar a Eunice Muñoz a contar histórias para mim (e não só). Naquele tempo tínhamos apenas (?!) dois canais de televisão (e chegavam) e era num deles que esta actriz aparecia para me encantar e dar tranquilidade à minha Mãe. Durante o tempo que durava o “meu” programa, estava muito sossegada e quase não me mexia.

Lembro-me de, nos meus primeiros tempos em Lisboa, ter visto a Eunice Muñoz (com o Ruy de Carvalho) a representar “A Casa do Lago”, no Politeama. Aquela seria, segundo diziam, a sua despedida do teatro (felizmente não foi). Naquele tempo a Eunice Muñoz estava (muito mal) reformada do Teatro Nacional D. Maria II mas, continuava (e continuaria e continua) a encantar.

Lembro-me de, há uns anos, ter ido a Oeiras, numa tarde de Domingo, ver a Eunice Muñoz. Ali fiquei muito feliz quando vi que a “nossa” actriz iria representar numa bonita sala que tem o seu nome e que a homenageia. Ela estava em casa! Naquela tarde representou (inesquecivelmente) “Miss Daisy”.

Lembro-me de, há uns tempos, em casa de uma amiga do meu Pai, em Lisboa, ter escutado a Eunice Muñoz a declamar poesia. Não, esta actriz não estava lá em casa mas um velhinho gira-discos fez soar a sua voz. Fiquei maravilhada! A “herdada” amiga tem um precioso vinil, que deve ter quase a minha idade, onde Eunice Muñoz declama divinamente.

Hoje voltei ao Teatro Nacional D. Maria II para (re)ver Eunice Muñoz. A primeira coisa que me alegra é ver que esta actriz está de volta à sua “casa”. Desta vez escutei-a num emocionado e comovente monólogo: “O Ano do Pensamento Mágico”, uma peça de Joan Didion baseada nas suas memórias. Eunice Muñoz está sozinha em palco a falar sobre a vida e a verdade é que não se dá pelo tempo a passar. A verdade é que nos emocionamos e sorrimos, a verdade é que nos revemos em muito do que nos conta, ao longo de cerca de uma hora e meia. Faço uma sugestão aos meus leitores: venham a Lisboa ver a “nossa actriz” (esta peça estará no Teatro Nacional D. Maria II até ao dia 20 de Dezembro, de 4ª a Domingo).

“A vida muda depressa. A vida muda no instante. Sentam-se para jantar, e a vida como a conhecem termina”.

sábado, 20 de março de 2010

Ano Novo

Que as pessoas que gostam de mim continuem a gostar. Que os meus sobrinhos continuem a saltar e a rir à gargalhada. Que os meus amigos queiram continuar a ser a minha casa. Que os meus textos continuem a ser publicados. Que os terroristas falhem a pontaria. Que o Inverno seja breve, a Primavera longa e o Verão quentinho. Que o governo governe e a oposição se oponha. Que os corruptos se cansem de ter. Que os presidentes de câmara não me tirem o sono. Que os “donos do mundo” poupem no sofrimento dos mais pobres. Que os que estão tristes sorriam. Que a equipa nacional de futebol nos faça saltar de alegria. Que a Académica se mantenha. Que o Porto seja campeão. Que o Barcelona continue o maior do mundo. Que se globalizem a dignidade e o futuro. Que a minoria que lê (jornais e livros) seja um pouco mais numerosa cada dia que passa. Que “O Despertar” celebre mais um aniversário. Que o cancro se cure e a sida se vacine. Que os que choram sequem as suas lágrimas. Que os traficantes de droga fiquem no desemprego. Que os desempregados encontrem trabalho. Que os aviões de passageiros não caiam. Que os ditadores se suicidem. Que os ladrões se arruínem. Que todas as crianças vivam sem trabalhar. Que o novo Hospital Pediátrico de Coimbra abra as suas portas. Que os idosos adormeçam sem saber que não se despertarão. Que a Casa dos Pobres inaugure a nossa nova casa. Que – como diz o cantor espanhol Sabina – os que matam morram de medo. E que os meus leitores me continuem a ler…
Feliz Ano Novo.

segunda-feira, 15 de março de 2010

Natureza

Começo o ano como gosto: com uma brutal gargalhada…
Estou “zangada” com a natureza. É verdade!
Normalmente nunca tenho um lugar para estacionar o carro perto da minha casa, em Lisboa. Acontece, frequentemente, chegar a Telheiras com o carro muito carregado, ter que estacionar longe e andar a fazer kms, com os sapatos, a descarregá-lo. As pessoas que me são mais próximas já conhecem o “ritual” de descarregar o carro. E…já se riem!
Há dias, a primeira vez em anos, arranjei um lugar mesmo à porta de casa. Não podia acreditar! No dia seguinte não fui trabalhar e por isso fui a pé fazer as compras no bairro. É verdade! Confesso que a principal motivação para andar a pé não foi a saúde (andar a pé faz bem!) mas, sim a alegria de ver o carro paradinho ali mesmo à porta de casa. Quase que me apetecia saltar de contentamento por ter o carro tão bem paradinho.
Um dia depois, à tarde, foi tempo de finalmente sair com o carro. Quando me sentei ao volante não podia acreditar no que estava à minha frente: o vidro estava todo sujo com o “trabalho” dos meus “vizinhos” pássaros. “Meu Deus, o que é isto?!”, pensei. Assim que o carro começou a trabalhar tentei, com as escovas, disfarçar o que se mostrava impossível de disfarçar. Fui para a Universidade, cheia de vergonha pelo estado do vidro e de toda a parte da frente do carro. Assim que estacionei ocupei-me a tirar todas as folhas que ainda tinha em cima do carro e deste modo estava a “curtir a minha neura”. Dai a pouco escutei um colega perguntar: “Clara, o que aconteceu ao teu carro? Onde o deixaste?”. Não podia acreditar. Esta era a primeira vez que encontrava um colega no parque de estacionamento. “Porquê hoje?!”. Naquela altura o meu carro parecia um “pijama às bolas”, e eu estava corada como há muito tempo não me lembro de ter ficado.
Naquela noite, quando regressei a casa depois das aulas, lembrei-me da minha “zanga” com a natureza e… deixei o carro longe, sem árvores por perto!!!

segunda-feira, 8 de março de 2010

Uma Ternura…

Antigamente era assim: sempre que íamos a Espanha e no nosso caminho ficava o “El Corte Inglês” nós, as três Marias, delirávamos! Éramos nessa altura verdadeiras fãs de escadas rolantes e, enquanto os Pais faziam as suas compras, passávamos horas piso acima, piso abaixo. Sempre que nos cruzávamos nas escadas era uma verdadeira galhofa. O Pai marcava uma hora para o nosso (re)encontro na cafetaria do último piso e este compromisso era, por nós, religiosamente cumprido. A nossa liberdade tinha este “preço”. Quando nos (re)encontrávamos era uma “festa”: tortilha de batata, fanta de laranja e…belas gargalhadas.

Hoje é assim: temos em Portugal dois grandes armazéns da cadeia espanhola e, com muita frequência, vou ao “El Corte Inglés”, em Lisboa. Normalmente vou até á cafetaria do último piso e, escadas rolantes acima (a abaixo), recordo a pequena Clarinha de há 30 anos atrás. Nesta tarde frenética de saldos não me apetece fazer compras mas, apenas (?) ler. Esta cafetaria tem a vantagem de ter o serviço mais lento que conheço em Lisboa e por isso até posso ler livros inteiros que ninguém se importa. É como se eu fosse transparente! Aproveitei para terminar um livro: “Si Te Comes Un Limón Sin Hacer Muecas” (Se Comes Um Limão Sem Fazer Caretas), de Sergi Parmies e começar outro: “Bingo” de Esther Tusquets. (Muito dificilmente poderia ter escolhido melhor os livros para esta “tarde espanhola”). Ao mesmo tempo que recordo o passado antecipo o futuro. À minha frente está uma mesa onde lancham 4 amigas com cerca de 70 anos. Imagino-me daqui a 30 anos a lanchar neste mesmo sitio na companhia de amigas (jovens da minha idade) e, com os meus livros na mão. Reparo que uma das senhoras bebe um leite UCAL com chocolate…eu vou ser assim! Não posso deixar de sorrir quando vejo um senhor idoso chegar com o seu portátil e o respectivo rato. Aqui, muito perto de mim, numa simpática mesa monta o seu equipamento e ali está todo interessado a olhar para o ecrã (e para mim). Deve pensar: o que estará a escrever?!

Antigamente era uma graça, hoje é muito giro e, daqui a 30 anos vai ser uma ternura…

domingo, 7 de março de 2010

“Sustomóvel”

Um Domingo muito tranquilo passado em Lisboa. O ritual da manhã é, frequentemente, o mesmo: padaria e café. Quando estava já muito tranquila no café, a preparar-me para ler, enquanto esperava fazer o meu pedido, dei conta que me faltava o telemóvel no meu bolso esquerdo (é ali o seu sitio). Susto! Onde está o meu telemóvel? Lembrava-me de ter olhado para ele antes de sair de casa e de ter pensado: vou levá-lo.

Deixei os jornais em cima da mesa (A Bola e o DN), deixei o livro em cima da mesa (“Anos Difíceis”, de António Barreto), deixei o chapéu-de-chuva junto da mesa e…sai a correr (depois de ter avisado que voltaria). A verdade é que nunca perco uma oportunidade para correr e esta manhã tinha a minha vida facilitada pois estava “equipada” com umas confortáveis sapatilhas. Fui ao carro, vi todos os sítios possíveis e…não encontrei o meu (muito querido e já saudoso) telemóvel.

Regressei ao café com a certeza que o meu “café da manhã” não iria ser tão tranquilo como desejava (e merecia). Não conseguia deixar de pensar no transtorno que é perder um telemóvel: vou ter que avisar muita gente, como vou recuperar toda aquela informação? (números de telefone, endereços de e-mail, datas de aniversário, lembretes, etc.). Acredito que neste momento os meus Leitores devem estar a pensar: existem “back-ups” para prevenir estas situações! É verdade, poderia (e deveria) ter toda esta informação guardada no meu portátil (que também precisa de um “back-up”) ou num “não-backupável” simpático bloquinho. Confesso que um dos lembretes que tenho (ou tinha?) no meu telemóvel diz (ou dizia?): fazer back-ups (sim, tenho algum “stress digital”).

Continuando…apesar de estar preocupada com o telemóvel (ou melhor, com o não-telemóvel) resolvi ler (em “passo de corrida”) os jornais e tomar o pequeno-almoço (com muito pouca tranquilidade). O jornal desportivo mostrou-me os resultados dos jogos de futebol de ontem (tristeza no Porto e alegria em Barcelona) e o outro jornal mostrou-me a tragédia do Haiti, o sonho do poeta que quer ser Presidente e a indignação com as constantes “surpresas” do BPP. Ainda li uma deliciosa crónica de António Barreto e…regressei a casa.

Confesso que fiz a pequena viagem de carro mais rápido do que o normal (o carro precisa de “correr”) e entrei em casa em verdadeiro “sprint”. Ali, naquele cantinho em cima de um livro (“Onde Há Crise Há Esperança”, do Pe Vasco Pinto de Magalhães) estava o meu telemóvel. Olhou para mim, muito espantado, e disse: “Porque é que estavas tão preocupada? Não te lembravas que tinha ficado em casa?”. Neste dia, para minha grande surpresa, o meu telemóvel falou comigo!

Lisboa, 17 de Janeiro de 2010
A direita entra-me no bolso…

Já confessei o “crime” da minha pasta azul. Sim, aquela que me acompanha (quase) sempre e está cheia de canetas, pequenos blocos de apontamentos, cadernos, etc.; Já confessei o “crime” dos lembretes do telemóvel. Sim, todos aqueles lembretes que me vencem diariamente. Hoje, é dia de confessar o “crime” dos bolsos…

Ando sempre com os bolsos cheios. Não, a verdade é que ando sempre com os bolsos com lotação esgotada. Ou melhor, em “overbooking” (muita coisa a querer entrar mas sem caber). A quantidade (e qualidade) das coisas que andam nos meus bolsos foi aumentando à medida que a minha idade foi crescendo. Antigamente trazia uma carteira no bolso de trás das calças onde passeava, orgulhosamente, as primeiras moedas e os primeiros cartões. Quando me sentava aquela carteira causava-me um grande desconforto. Mais tarde passei a usar a minha carteira num dos bolsos da frente mas, também dai teria que sair para um dos bolsos do casaco e, finalmente, para dentro de uma carteira que anda a tiracolo.

Os meus bolsos (ainda) cheios são hoje o prolongamento da minha casinha lisboeta. No bolso do lado direito anda normalmente a chave do carro. O chaveiro que a acolhe apenas tem uma chave (o que é um grande alivio!). No bolso do lado esquerdo anda a chave da casa de Lisboa ou a chave da casa de Coimbra. Qualquer destas chaves está acompanhada de muitas outras, a maior parte das quais não sei o que abrem! Ali, no bolso esquerdo “mora” também o telemóvel que desejo não toque (se isso acontece não o consigo tirar do bolso a tempo de o atender). Quando as calças que visto são “à carpinteiro”, ou seja, com bolsos nas pernas, não é nada difícil enchê-los: caneta, bloco, lenços de papel, etc., etc., etc.; Os bolsos do casado são o desastre total. Vamos ao inventário. O bolso do lado esquerdo tem uma luva. O bolso do lado direito tem: a fantástica caneta com que escrevo este texto, uma pequena embalagem de lenços de papel, um leitor de MP3 com o seu acessório, outra luva, uma pequena embalagem de gel anti-gripe A (recolhida num dos hotéis que é a minha casa), um cartão da loja “A Vida Portuguesa”, dois pequenos blocos cheios de letras (que dão origem a textos para “O Despertar”) e, por último, uma informação turística sobre uma das minhas mais recentes descobertas: o Parque Biológico da Serra da Lousã, em Miranda do Corvo (a visitar, visitar e voltar a visitar). Contrariamente ao que parece os bolsos do meu casaco estão neste dia em versão “light”. É muito natural que os meus leitores se questionem sobre o porquê de no lado esquerdo apenas ter uma luva e no lado direito tanta coisa. A resposta é muito simples: sou canhota e a mão direita está sempre mais livre para entrar no bolso!

quinta-feira, 4 de março de 2010

Ler é…Viver

Gosto imenso de ler jornais. Cresci rodeada por jornais e por isso estes acompanham-me há muitos anos. Todas as pessoas que me são mais próximas sabem que é normal eu ter comigo (ou no carro) o “saco dos jornais”. Os meus jornais também fazem muitos kms e independentemente do sítio onde tenham sido comprados, terminam a sua vida em Coimbra onde são também lidos pelas Marias lá de casa.

Há quase 10 anos, quando vim para Lisboa, os senhores do café onde almoçava diariamente guardavam-me os jornais. O meu carro parecia nessa altura uma tabacaria pois andava sempre “forrado” de jornais. Tive que acabar por pedir que não me dessem mais jornais (o que me custou muito) porque o meu ritmo de leitura era bastante inferior ao ritmo das “ofertas”.

No final do Verão passado tomei uma decisão que me custou muito: não compro mais jornais até terminar de ler todos os que tenho em atraso lá em casa. Meu Deus, que decisão difícil. Tinha que ser! Apesar de ter tomado esta decisão estou muito longe de deixar de os ler: pareço aquelas pessoas que deixam de fumar e fumam os cigarros dos outros. Procuro sempre cafés que têm jornais, fico em hotéis com jornais (a primeira coisa que faço quando chego é a “limpeza”) e quando vejo um colega a ler o jornal (qualquer que seja) digo logo: no final dá-me o jornal, não o deites fora.

Gosto de ler (quase) todos os jornais que me passam pela mão mas, confesso que tenho uma preferência pela edição de Domingo do diário espanhol El Pais. Na sua revista escrevem frequentemente alguns dos escritores espanhóis de que mais gosto como por exemplo Maruja Torres, Almudena Grandes, Juan José Millás e muitos outros. Esta manhã estive a trabalhar na “recuperação do atraso” e por isso peguei na edição da revista “El Pais Semanal” do dia 29 de Março de 2009. Aqui li um pequeno texto enviado por uma leitora com o seguinte titulo: “Ler é viver”. Esta senhora, com 89 anos, enviou um e-mail (?) para o jornal onde, entre outras coisas, escreveu o seguinte: “As minhas amigas perguntam-me para que quero saber tanto com a idade que tenho. Eu respondo que um grande filósofo disse que ler é viver, eu quero viver um pouco mais.”

Sou incapaz de deitar fora um jornal sem o ler (nem que demore anos) e as “minhas” Marias já estão avisadas: os jornais que deixo em Coimbra, desde o Verão passado, não contêm noticias mas sim história!